CONCEITOS
E CATEGORIAS MAQUIAVELIANAS
PRIMEIRA
PARTE: Fortuna, Virtude e Aparência.
De: Adelmir Barbosa
Virtude
e fortuna ocupam o cerne, por assim dizer, do pensamento maquiaveliano. São
esses conceitos, portanto, que lançam as bases de todo o discurso
político-filosófico.
Os conceitos
de Fortuna e de Virtù são tratados, por Maquiavel, de modo bem singular, no
sentido de que suas significações conceituais transcendem aos conceitos que
comumente se usam e se aplicam no campo da filosofia moral. Em Maquiavel esses
conceitos assumem um arcabouço teórico-significativo que ultrapassam os limites
dos ditames morais.
Contudo, e não poderia ser diferente, em se
tratando de filosofia política; além dos conceitos de Virtude e Fortuna,
Maquiavel vai abordar e discursar, ainda, sobre os conceitos de Governo,
Estado, poder e Aparência na tentativa de defender com argumentos plausíveis
sua teoria acerca da ascensão e da manutenção do sucesso, da glória e do poder.
Portanto,
Virtude e Fortuna em Maquiavel não podem ser associados aos conceitos de
princípios e de normas morais; mas são elementos necessariamente “úteis”,
segundo Maquiavel, à ascensão e à manutenção do poder.
O Conceito de Fortuna.
O
conceito Maquiaveliano de Fortuna está
mais intrinsecamente relacionado aos conceitos de fatalidade e acaso do que
necessariamente, à abastança ou riqueza. Evidentemente, por se reportar a uma
entidade divinizada pelos romanos, que por sua vez, segundo a crença, podia
dotar alguém tanto de grandes riquezas quanto da falta destas, a Fortuna em Maquiavel se reporta às
obras, eventos e acontecimento imprevistos, casuais dos quais não se pode
garantir o advento da abundância de bens e riquezas ou escassez destes.
Segundo
Maquiavel é atribuída à Fortuna a
responsabilidade por, pelo menos, metade do sucesso ou da ruína de quaisquer
que forem os empreendimentos de quaisquer que sejam as pessoas; privadas ou
governantes. É claro que segundo Maquiavel qualquer indivíduo, especialmente o
governante, que queira alcançar o sucesso e mantê-lo não deve jamais firmar as
bases de suas empreitadas unicamente na Fortuna,
pois esta desconhece conceitos humanos de dignidade e merecimento, ou
quaisquer outros requisitos e/ou pré-requisitos que a faça privilegiar uns em
detrimento de outrem. Suas graças e desgraças, venturas e desventuras, fortunas
e infortúnios são regidos pela fatalidade, pelo acaso; podendo, portanto,
proporcionar tanto a riqueza quanto a pobreza, tanto o sucesso quanto a ruína.
O
único meio para se evitar a falência dos empreendimentos humanos e alcançar
somente os favores da Fortuna será a
subjacência de um atributo necessário a qualquer homem, especialmente àquele
que aspire ascender ao governo da “polis” e se manter no poder. Esse atributo
Maquiavel chamou de Virtù.
O Conceito de Virtù.
Alguns
comentadores da “Teoria Maquiaveliana” aconselham a não se traduzir o termo
virtù, para não se confundir com o conceito de Virtude no universo da reflexão
moral. De fato, na perspectiva da moral, o termo Virtude assume uma
significação teórico-conceitual bem distinta da significação expressa em “O
Príncipe”.
Entretanto,
traduzindo-se ou não o referido termo, o importante é compreender que o
conceito maquiaveliano de Virtude está mais relacionado aos meios dos quais se
lança mão para se ascender e se manter no poder.
Refere-se,
pois à competência e à capacidade de alguém, público ou privado, de vislumbrar
e antevê as manifestações da Fortuna, de modo que esteja sempre preparado para
vencer as adversidades impostas pelo acaso e pelas fatalidades dos
acontecimentos; sejam eles de ordem natural ou social, econômica e/ou política;
sendo, portanto, capaz de aproveitar as oportunidades que por ventura venham a
surgir com esses acontecimentos, em favor da manutenção do Estado e do Poder em
suas mãos e “esquivando-se” e/ou eliminando obstáculos que venham a surgir
nessa busca.
O Conceito de Aparência.
O
governante ou quem quer que seja que aspire ao poder deve antes de tudo manter uma
“Aparência” específica. Para Maquiavel, cinco qualidades devem ser observadas
com especial atenção por aqueles que aspirem alcançar as graças de seus
governados. O governante ou alguém que aspire ao governo deve sempre “parecer piedoso, fiel, humano, íntegro,
religioso, e sê-lo realmente, mas estar com o espírito preparado e disposto de
modo que, precisando não sê-lo, possas e saibas tornar-te o contrário”. (MAQUIAVEL, Nicolau. O
Prícipe. © Copyleft
"Cultura Brasileira" - 1998 - 2013 - LCC Publicações
Eletrônicas)
O
governante ou aspirante ao governo deve, pois, empenhar-se em se mostrar digno
de ser louvado, ou seja, deve assumir e manter uma postura moralmente agradável
ao povo. Entretanto, não há necessidade de se possuir todas essas qualidades. O
que importa é que o povo, mesmo equivocado, as veja no indivíduo que os
governa.
Desse
modo, a piedade, a fidelidade, a humanidade, a integridade e a religiosidade
são qualidades tratadas por Maquiavel como elementos úteis, dos quais o
governante deve dispor para manter uma aparência que lhe possibilite manipular
a fortuna ao seu favor e assim, engendrar
os meios necessários para ascender e se manter no poder. Não necessita,
portanto, possuir tais qualidades. “Antes,
ousarei dizer que, possuindo-as e usando-as sempre, elas são danosas, enquanto
que, aparentando possuí-las, são úteis”. (MAQUIAVEL, Nicolau. O Prícipe. © Copyleft
"Cultura Brasileira" - 1998 - 2013 - LCC Publicações
Eletrônicas).
Assim, a “Aparência” em Maquiavel será um dos muitos
elementos ou atributos que compõem a Virtude do governante ou aspirante ao
governo. A Aparência será um dos muitos meios úteis dos quais o governante ou o aspirante ao governo terá que lançar mão para alcançar o sucesso em seus empreendimentos. O que torna mais clara a distinção entre virtudes morais e Virtude
maquiaveliana.
Obs: Próxima postagem da Série “SACADAS
MAQUIAVELIANAS: Os Conceitos de Estado, Governo, Poder.